Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
Neste ano a festa de Corpus Christi se comemora o dia 20 de junho.
O maná que Deus enviou para alimentar os judeus durante a travessia do deserto, após abandonar o Egito sob a direção do profeta Moisés rumo à Terra Prometida, mudava de gosto.
Por causa disso diante do Santíssimo Sacramento exposto, antes de dar a bênção, o padre ajoelhado usando uma muito bonita capa pluvial cantava: Panem de caelo, prestistis eis alelluia, Vós destes a eles pão do Céu, aleluia. Quer dizer, o maná.
O coro respondia: Omne delectamentum in se habentem, alelluia, Que tinha em si todos os sabores aleluia.
Isso fazia parte daquela distinção, daquela classe, daquela categoria, de uma bênção do Santíssimo Sacramento bem dada.
Com o Santíssimo resplandecente dentro de um sol de ouro, a interlocução entre o oficiante e o povo representado pelo coro, era esta: vós destes a eles um pão do Céu.
E o coro respondia: que contém em si todos os sabores.
Arranhando pedaços de latim, ou nada entendendo, o fiel percebia alguma coisa de uma superior beleza que excede em categoria todo o cerimonial humano.
Na igreja de São Bento, no centro de São Paulo, há uma belíssima capela do Santíssimo Sacramento.
É um dos lugares de São Paulo onde, fugindo da agitação da cidade, se pode comungar com mais agrado.
Ou, mais simplesmente, passar por lá durante o dia, e fazer visitas ainda que rápidas ao Santíssimo Sacramento.
Não há o que incite mais à piedade do que algo composto. E a capela, prima pela beleza, pela distinção e compostura.
Essa capela tem o teto baixo e é separada por alguns degraus da igreja.
O conjunto de circunstâncias arquitetônicas e artísticas ajuda a dar a impressão de estar ali Jesus prestando atenção em cada visitante.
Nossa Senhora tem um papel nisso. Ela não faz entre Deus e nós o papel de corpo opaco nem mesmo translúcido, mas o da lente.
A devoção a Maria representa o cristal que se coloca no ostensório diante da Hóstia: todo olhar deve passar por ele para se chegar a ver as Sagradas Espécies.
Ele não prejudica a visão; pelo contrário, necessariamente é preciso passar-se por ele para vê-lO de uma maneira mais nítida.
São Luís Grignion de Montfort explica muito bem o fundamento teológico disso: Nossa Senhora é como uma lente poderosa e pura, que concentra em nós as graças que vêm de Deus.
Como é lindo o operar discreto de Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento!
Porque Ele tem pena de nós.
Todos nós de algum modo quando entramos num recinto sagrado onde está o Santíssimo Sacramento, o mais das vezes algo nos diz que Ele está lá.
Então Ele conversa conosco na noite dos nossos sentidos, mas de uma forma que é muito mais nobre do que o puro ver e o puro sentir material.
Ele nos diz: “Eu estou presente”.
O convívio eucarístico é inteiramente indescritível. Ele nos consola com uma esperança, que é um prenúncio de toda a alegria que vamos ter em vê-lO no Céu por toda a eternidade.
Há um jogo da misericórdia infinita dEle.
Porque Ele sustenta com condescendência a fraqueza do homem.
Um homem que tenha visto Nosso Senhor com os olhos carnais no tempo em que Ele estava nesta vida, vamos dizer por exemplo Pilatos ou Herodes, talvez não tivesse sentido nada do que cada um de nós sente aos pés do Sacrário ou do ostensório.
Nós, entrando na igreja, já vamos sentido a influência divina sabendo que a 20, 30 metros de nós, sozinho, numa sala com lamparina acesa e circundado de anjos numa quantidade inexprimível, está Nosso Senhor Jesus Cristo realmente presente.
Nosso Senhor fez uma coisa grandiosa, divina, quando instituiu a Eucaristia.
Ele pensou nessa magnífica influencia que Ele exerceria sobre todos os homens que se aproximariam até Ele durante milênios.
Santíssimo Sacramento adorado na igreja das Bernardinas, Cracóvia, Polônia |
Por isso podemos dizer com a alma cheia, como os judeus no deserto diziam do maná: Omne delectamentum in se habentem.
Quer dizer, o Santíssimo Sacramento tem em si toda espécie de deleites. Sobretudo quando as nossas almas se abrem para a beleza, a honra e a glória, o lumen – a luz divina – da vocação de católico.
Porque o maná era assim.
O nosso lado bom é assim, e só o conhecemos bem quando nós nos detemos a degustar esse convívio, sozinhos, ajoelhados, numa meia luz, no silêncio, diante do Monumento que conserva a Jesus vivo mas que nos fala no mais fundo da alma.
Assim, percebemos melhor como a balbúrdia e o caos em que o mundo afora afunda cada dia mais não é nada, e está condenado a passar e desaparecer.
E ao mesmo tempo podemos ouvir ao infinito no fundo das nossas almas o canticum novum do Reino de Maria que se regozija em cada um de nós.
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Amém, Alelluia
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